quarta-feira, 14 de julho de 2010

Alguém tem algo a declarar?

Dr Agenor ajeita-se na cabeceira da mesa. Terno cinza com gravata em tom parecido. Um pouco amassado. Maleta no chão junto ao pé da mesa. Documentos timbrados em suas mãos.
Pigarreia. Senhores, senhores... Por favor. Um minuto... Ruídos vocais. Um minutinho... Silêncio Ótimo. Bem, como todos sabem estamos aqui reunidos para lermos o testamento do Dr. Felipe Barreto que recentemente nos deixou. Colando seus óculos de leitura nos olhos, o velho advogado da família percorre seus olhos num documento e com sua mão esquerda coça a perna esbranquiçada. Ah sim, aqui está. O testamento cerrado foi firmado em doze de dezembro de 2006. Depois vocês podem checar as assinaturas das testemunhas e do Dr. Felipe. Está lacrado; ficou no meu cofre desde 2007.

Beth, viúva bem rejuvenescida, com lenço nas mãos, vestido comprido negro, filhas desoladas, garoto pequeno no chão brincando fora da densa atmosfera de velório. Tio Paulo, amigo e padrinho de Pietro, prima Verônica e Jussara ouvindo da porta. Limpa suas mãos no pano de prato e presta atenção no advogado que rasga a ponta de um envelope amarelado que contem o tal testamento. Coisa de rico!

Bem, aqui está, vamos ver.
Peço silencio pois vou ler o testamento.

Eu, Felipe Barreto, RG numero tal,CPF número tal – não precisa ler tantos detalhes, não é? - gozando de plena capacidade física e mental com minha livre e espontânea vontade e dentro dos limites que este instrumento me outorga, faço conhecer o meu desejo de destinação de meus bens que a lei me assegura.

À minha querida companheira Elizabeth Felix Barreto, deixo a nossa casa, meu carro Mercedes negro, blindado, R$ 350.000,00 e mais rendimentos anuais das ações em carteira na Corretora Bueno & Filhos. Após 5 anos de minha morte, essas ações já estarão liberadas para venda em pregão e cujo valor líquido extraído seja dividido 50% para a viúva e outros 50% em partes iguais para meus 3 filhos. Nomeio desde já tutor para este fim e outros cabíveis para o meu filho mais novo, o meu digníssimo advogado e procurador Dr. Agenor, que neste momento lê este documento.

O imóvel rural denominado Fazenda Bosque dos Barreto, situado no município de Extrema (SP) em partes iguais para minha filha mais velha, Beatriz Felix Barreto e Maria Clara Felix Barreto. Também deixo R$ 250.000,00 em aplicações financeiras no Banco do Brasil, agencia tal e tal para cada uma delas para pagar seus cursos universitários.
Continuando... Ao meu caçula Pietro Felix Barreto, menor, deixo nossa casa de praia e R$ 320.000,00 para custeio de sua vida incluindo seus estudos universitários. Ao tutor por mim nomeado caberá monitor estes gastos. O dr. Agenor receberá mensalmente a quantia de 20 salários mínimos para pagamento de honorários extraído da massa financeira da viúva meeira e filhos.

Finalmente, deixo para o meu melhor amigo Josias Siqueira dos Anjos a srta. Marlene Tobias dos Santos, CPF e RG número tal e tal, minha amante durante 20 anos, que saberá desfruta-la tal como fiz ao longo deste tempo. À srta. Marlene destino jóias e valores sob custódia na mesma agência do Banco do Brasil, cuja senha encontra-se sob sigilo com o meu advogado. Lembro ao amigo Josias que a srta. Marlene não permite relações anais nem suporta atos sádicos e masoquistas.
Favor comunicar o sr. Josias e a srta. Marlene o teor deste desejo uma vez que, presumo, não estejam presentes neste momento.
Estas constituem a livre expressão da minha vontade e do meu desejo mais profundo. O documento foi lavrado em 12º cartório da capital no dia 12 de dezembro de 2006, tendo como testemunhas o sr. Ricardo Monteiro de Carvalho, dona Lívia Nunes Parente e o sr. Carlos Roberto Vargas y Lopez.
Silêncio longuíssimo.
Bem, parece que é isso. Dr. Agenor levanta os olhos para os presentes...
Alguém tem algo a declarar?